O desdobramento do processo contra a Fifa nos Estados tirou o sossego
dos irmãos Marinho e da cúpula da Rede Globo, porque a Justiça
norte-americana está avançando com celeridade as investigações, com a
ajuda do empresário argentino Alejandro Buzarco. Quando o promotor lhe
perguntou se o pagamento de propinas a dirigentes da Fifa em busca dos
direitos de transmissão era realizado em parceria com as emissoras, o
delator citou empresas de comunicação de diversos países: “Várias. Fox Sports, dos Estados Unidos, Televisa, do México, Media Pro, da Espanha, TV Globo, do Brasil”
– disse ele, que também afirmou ter-se associado a companhias com
atuação no mesmo ramo de negócios que a sua Torneos y Competencias, como
a brasileira Traffic e a argentina Full Play.
O delator já revelou também que a TV Globo, a mexicana Televisa e sua
empresa Torneos y Competencias pagaram juntas US$ 15 milhões em propina a
Julio Humberto Grondona, ex-chefe do futebol argentino, pelos direitos
de transmissão da Copa do Mundo de 2026 e 2030. O valor, que garante
direitos de TV, rádio e internet, teria sido depositado no banco Julius
Bär, sediado na Suíça.
GLOBO NEGA TUDO –
A TV Globo nega qualquer participação em irregularidades. Afirma que em
2015, um ano após o surgimento do escândalo conhecido como Fifagate,
abriu “amplas investigações internas” e teria sido apurado que o Grupo
Globo “jamais realizou pagamentos que não os previstos nos contratos”.
Se for conferida a contabilidade da TV Globo, essas declarações serão
consideradas verdadeiras, porque não houve participação direta da
emissora nas mutretas da Fifa. Quem se encarregava do chamado papel sujo
era a empresa de marketing Traffic, do ex-repórter esportivo J.
Hawilla, que se tornou empresário de enorme sucesso, e o próprio diretor
da Globo Esportes, Marcelo Campos Pinto, que foi demitido em 2015, logo
depois da prisão de José Maria Marin, presidente da CBF, na Suíça.
No mundo dos negócios esportivos, J. Hawilla foi do zero ao milhão numa
rapidez impressionante, de fazer inveja ao filho fenômeno de Lula.
Associou-se à Globo e, por coincidência, passou a ser dono ou controlar
grande número de emissoras no interior de São Paulo, filiadas à rede da
família Marinho. No embalo, virou empresário internacional de sucesso,
comprou um time da segunda divisão portuguesa, o Estoril Praia, e
levou-o disputar a Liga Europa. Para ele, o céu parecia ser o limite.
PARCEIRO DE SUCESSO –
O sucesso da Traffic era espantoso. Disputava com a Globo, a Record e a
Bandeirantes os direitos de transmissão de importantes eventos
esportivos na Fifa e saía vencedora.
Hoje, o problema dos irmãos Marinho, que faziam negócios pessoalmente
com J. Hawilla, é saber até onde vai a lealdade do parceiro. O FBI
começou as investigações em 2011, para apurar ocorrências desde 1991. E
os policiais federais americanos logo chegaram à Traffic. Quando
constatou que seria apanhado, J. Hawilla se adiantou e, em 12 de
dezembro de 2014, confessou-se culpado perante a Justiça dos Estados
Unidos. Assumiu as acusações de extorsão, conspiração por fraude
eletrônica, lavagem de dinheiro e obstrução da justiça e concordou em
restituir US$ 151 milhões, tendo pago US$ 25 milhões no momento do
acordo.
Segundo o Departamento de Justiça dos Estados Unidos, o dinheiro está
reservado caso as vítimas dos crimes devam ser restituídas.
NÃO PODE MENTIR –
Em seus depoimentos, o empresário argentino Alejandro Buzarco está
citando diretamente a Globo, não a Traffic. Ele sabe que não pode
mentir, porque sua delação premiada logo seria anulada. A Globo alega
que jamais pagou propina, mas tudo indica que esse papel sujo esteve a
cargo da Traffic, até porque J. Hawilla sempre transferiu à rede da
família Marinho os direitos de transmissão dos campeonatos que a Traffic
conquistou junto à Fifa, mediante propina. Se você acredita em
coincidência, é um prato feito.
O relacionamento íntimo entre J. Hawilla e os irmãos Marinho não tarda a
ser investigado. É aí que mora o perigo. Hoje, J. Hawilla é um homem
muito rico, com patrimônio de aproximadamente R$ 2 bilhões. Aos 74 anos,
no final de emocionante jornada, não deve nada a ninguém. Já é delator,
mas não disse tudo o que sabe. Sua lealdade à Globo hoje está por um
fio e não vale uma nota de três dólares.
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